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terça-feira, 26 de maio de 2009

Desdobramentos da Crise Coreana

A crise atual é um novo round da disputa bifásica que condiciona interna e externamente o regime de Pyongyang.
No front externo, o governo norte-coreano aproveita o "timing" ainda inicial da administração Obama para colocar a Casa Branca diante de fatos consumados e certo de que, pelo menos neste momento, seria improvável e impossível que os norte-americanos abrissem outra frente militar, afinal os compromissos no Iraque e Afeganistão já são por demais desgastantes.
Internamente, ela representa uma etapa na luta pelo poder que se trava nos bastidores do governo comunista. Comparando-se fotos recentes do ditador Kim Jong-Il, vê-se claramente sinais de uma debilitação, que segundo especulações decorreriam de um derrame recente. Assim, esta crise seria uma oportunidade de Kim reafirmar seu poder sobre s setores mais duros do governo norte-coreano num momento de possível transição.
Negociar a partir de uma posição de força, inclusive, serve para o plano externo. É evidente que uma Coreia do Norte nuclearizada é mais perigosa do que se não o fosse. E seu arsenal atômico calculado entre 7 a 12 armas de pequena potência é um poderoso e eficaz instrumento de barganha: pergunte a um sul-coreano ou japonês se ele está disposto a arriscar-se a receber uma bomba atômica no seu quintal? Ora, classificar um artefato atômico como de pequeno porte é um pequeno consolo quando a destruição pode ter SUA casa como epicentro.

Em abril passado o governo norte-coreano testou um foguete denominado de Taepodong-2, contrariando a pressão internacional e ameaças militares sul-coreanas, japonesas e norte-americanas. Segundo Pyongyang tratava-se um lançamento pacífico de satélite. Para os seus opositores tudo não passou de um teste camuflado para um vetor balístico de armas nucleares.
A resolução 1718 da ONU, respondendo a um teste nuclear anterior da Coreia do Norte, explicitamente proibia não só novos testes atômicos como também testes com mísseis, vedando de forma peremptória a aquisição destas tecnologias pelo governo comunista. Como segundo as autoridades locais de lá o teste era pacífico, as ameças serviram de pretexto para que não só as negociações envolvendo as duas coreias, o Japão, os EUA, Rússia e China, fossem congeladas, como ainda deram suporte a expulsão dos observadores da AIEA e a reativação do seu programa nuclear.
A Rússia disse que não aceitará medidas unilaterais, o que equivale a mandar uma mensagem de alerta ao governo dos EUA de que tenha cautela ao considerar ações agressivas ao sul do território russo, e na casa de um outrora aliado.
Por outro lado, se o governo de Pequim condenou as ações norte-coreanas, isso não significa um sinal verde para ações contra o regime de Kim. Seria um caos se no curso de uma reviravolta violenta em Pyongyang ou por desdobramentos de um ataque norte-americano, uma massa de refugiados forçasse a fronteira chinesa em busca de abrigo. Para o governo chinês, elevar o tom do discurso só serve se tiver como efeito reativar as negociações visando uma solução política.
Apoios condicionais estão na mesa, mas uma questão permanece central: como a comunidade internacional - e os EUA em especial - podem conter um regime ditatorial aparentemente incontrolável e disposto a tudo, militarista e pouco afeito a sujeitar-se à pressões externas?
Com 20 milhões de habitantes, tem mais de um milhão de soldados e gasta 1/4 do PIB em suas Forças Armadas. Fome e necessidades energéticas, que talvez servissem para tornar mais cooperativo o governo da Coreia do Norte, só tem servido para tornar o regime cada vez mais intolerante. As ameaças de reduzir ou cortar auxílios fornecidos pela comunidade internacional - como recentemente fez o governo sul-coreano -, são usados por Kim e sua "entouragé" como "provas" de que só por meio do incremento de seus recursos militares, aí inclusa a chantagem nuclear, poderá manter-se o regime, o comunismo, a independência, o internacionalismo...
A opção nuclear talvez esteja descartada pelo governo Obama para não correr o risco de uma ampliação geográfica da crise com fortes reações de Moscou e Pequim a uma eventual desenvoltura norte-americana em usar armas nucleares na "cozinha" deles. Mas não se pode descartar completamente um ataque convencional contra instalações de armas e mísseis prioritariamente, e de forma secundária a outros alvos militares. Mas certamente a Casa Branca ponderará a possibilidade de fracasso, total ou parcial de tal iniciativa.
Em ambos os casos uma retaliação nuclear dos norte-coreanos contra o sul da península e o Japão tem que ser considerada. Menos provável é um ataque ao teritório dos EUA, pois neste caso eles certamente reagiriam, nem que fosse por simples e devastadora vingança. Mesmo as demais potências nucleares regionais, apesar de protestos mais ou menos veementes, nada fariam, seja por temer uma escalada incontrolável, seja por entender que mesmo eles seriam forçados à uma reação nuclear em caso de ataque aos seus próprios territórios.
A temperatura está subindo e as opções ficando escassas. Ainda cabe à China o papel de bombeiro principal, mas a hora de apagar o incêndio apenas com água pode estar passando!

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