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domingo, 30 de agosto de 2009

É possível comparar o Hamas, a Al Qaeda e outros grupos?

Estas comparações são delicadas porque aparentemente são simples associações, porém, com um olhar mais profundo, podemos observar diferentes nuances.

O desenvolvimento da história recente do Oriente Médio, e recente aqui entenda-se nas últimas décadas, esteve condicionado por diferentes elementos conjunturais, tais como a dissolução do domínio otomano, a ocupação ocidental, a criação de Israel, o avanço do fundamentalismo islâmico, etc.

Neste ambiente marcado por profundas turbulências políticas, surgiram em momentos aproximados duas vertentes de um movimento que entendemos como um nacionalismo árabe: de um lado o que veio a ser influenciado pela política secular, sendo o Nasserismo um dos seus expoentes; e de outro ganhou força a proposta de instauração de governos islâmicos ou fundamentalistas.

É aqui que as comparações se turvam.

O Hamas (Movimento de Resistência Islâmica) é um movimento que teve origem no fundamentalismo, apostando por meio de políticas assistenciais no estabelecimento de bases sociais sólidas. Patrocinado por diversos governos muçulmanos e angariando doações nas comunidades islâmicas - e ironicamente (se é possível fazer ironia disto) também com financiamento israelense - o Hamas construiu uma rede de creches, postos de saúde, doações em dinheiro, bibliotecas, escolas e mesquitas. O apoio israelene decorria de um cálculo, hoje amaldiçoado, de que estimulando-se a vivência religiosa os palestinos seriam afastados do ativismo político - então mais perigoso - da OLP de Arafat.

Porém a proposta do Hamas não é a criação de um Estado Islâmico e sim de uma República Palestina. O confronto com Israel decorre que o território pretendido é onde hoje existe o Estado judeu. Assim, teoricamente, o Hamas é um movimento de resistência contra a ocupação israelense e não um movimento fundamentalista.

Aqui, por sua vez, o Hamas se diferencia de outra organização influente: as Brigadas de Mártires de Al Aqsa. Ligada ao Fatah de Yasser Arafat, as brigadas se distinguiram do movimento original quando este se circunscreveu à luta política, então um beco-sem-saída para a instauração de um Estado Palestino sobre Gaza e a Cisjordânia. Com o processo de paz paralisado ou em franco retrocesso, surgiram as Brigadas, apostando na luta armada contra o ocupante israelense.

Já a Al Qaeda é expressão de um islamismo ambicioso, que aspira impor o Corão sobre todo o mundo, coisa que nem o Hamas, nem as Brigadas de Mártires cogitam. Bin Laden, ao contrário de outros movimentos radicais levantou a bandeira de uma teocracia internacionalizada, indo além destes movimentos fundamentalistas originais, todos eles de caráter nacionalista: queriam o islamismo, mas também queriam seus Estados. Para os seguidores da Al Qaeda, a jihad (reduzida apenas ao conceito de guerra santa) objetiva a luta contra os EUA, o Ocidente, os governos muçulmanos tolerantes e os laicos, o capitalismo, o mundo moderno, as vertentes islâmicas não-sunitas...num niilismo religioso onde cabe a interpretação de Tariq Ali: "a perspectiva encolhida é a maldição do islã moderno".

A Al Qaeda (A Rede), reuniu diferentes grupos extremistas muçulmanos e produziu um geleia geral ligada pela imprecisão.

Depois da invasão do Afeganistão e a guerra contra o Talibã, especialmente depois da Batalha de Tora Bora, o movimento de Bin Laden tinha sido bastante enfraquecido - segundo Lawrence Wright em O Vulto das Torres - fracionado em quatro partes: Europa, Iraque, África do Norte e Paquistão. Mas foi justamente a invasão do Iraque, segundo ele, que propiciou a reorganização do movimento, com o influxo de novos recrutas (instruídos e não apenas fanáticos obtusos), um novo foco de descontentamento e permanente propaganda. Hoje o movimento reconstituiu-se no Paquistão e Afeganistão, além de Mali, Indonésia, e outros pontos.

As comparações são assim difíceis, pois reúnem num mesmo plano organizações com objetivos políticos leigos e religiosos, orientadas pelo sunismo ou xiismo, nacionalistas e multinacionais, etc.

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