EUA subestimaram diplomacia de Brasil e Turquia, diz
livro sobre acordo com Irã
Um livro publicado nos Estados Unidos e na
Grã-Bretanha sobre a política do governo Barack Obama em relação ao Irã afirma
que Washington subestimou a capacidade diplomática do Brasil e da Turquia de
conseguirem fechar um acordo sobre o programa nuclear de Teerã.
Segundo o livro
A Single Roll of the Dice ("Uma Única Jogada do Dado", em tradução
livre), do analista americano de origem iraniana Trita Parsi, em maio de 2010,
Washington contava com o fracasso da missão diplomática do então presidente
brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e do primeiro-ministro turco, Recep
Tayyip Erdogan, a Teerã.
Eles viajaram ao
Irã a pedido de Obama, que queria que o governo iraniano concordasse com um
plano de troca de combustível nuclear. O autor argumenta que, paralelamente à
missão de Lula e Erdogan, Washington estava costurando uma aliança
internacional para impor novas sanções contra o Irã.
Segundo o livro,
que foi publicado no mês passado, a Casa Branca aguardava apenas mais uma
resposta negativa de Teerã para anunciar novas sanções, mas foi pega de
surpresa pelo sucesso da missão brasileira e turca, que conseguiu fazer com que
o Irã concordasse com um programa de troca de combustível nuclear.
Surpreendidos
pelo resultado, os Estados Unidos teriam lançado uma campanha na mídia contra
Lula e Erdogan, para desautorizar o acordo firmado com Teerã.
Sanções ou acordo
Nos últimos
anos, o Irã vem desenvolvendo tecnologia atômica para aumentar a oferta de
energia no país. Segundo o seu governo, o programa tem apenas fins pacíficos,
mas as potências internacionais – sobretudo os Estados Unidos – acusam Teerã de
estar desenvolvendo armas nucleares.
O governo
americano lidera esforços para evitar que o Irã domine o ciclo completo da
produção de energia nuclear. Em 2009, Obama enviou uma carta aos chefes de
Estado de Brasil e Turquia, pedindo ajuda para mediar uma solução.
O Irã havia
aumentado a sua capacidade de enriquecimento de urânio. As potências ocidentais
queriam que o Irã aceitasse enviar 1,2 tonelada seu urânio para ser enriquecido
no exterior. Desta forma, o país não teria o domínio completo do ciclo de
produção nuclear.
No entanto,
segundo o novo livro, os americanos estavam mais interessados em impor novas
sanções ao Irã, do que em obter concessões do governo de Teerã.
"A
estratégia americana essencialmente se resumia a passar ao Brasil e à Turquia
uma mensagem dupla: esforços para convencer Teerã a concordar com uma troca de
combustíveis eram recomendáveis, mas também era importante impor novas
sanções", escreve o autor, em um capítulo dedicado apenas ao episódio
envolvendo Brasil e Turquia.
Em maio de 2010,
após o empenho pessoal de Lula e Erdogan, o Irã concordou em enviar 1,2
tonelada de seu urânio para ser enriquecido no exterior, sob supervisão da
Turquia, em um acordo que foi batizado de Declaração de Teerã.
"Contra
todas as previsões, Turquia e Brasil conseguiram em poucos meses, através de
intensa diplomacia, o que as potências ocidentais não haviam conseguido em
anos. "
'Vexame' para Washington
O que era para
ser um sucesso da diplomacia multilateral logo se provou o contrário, segundo o
autor.
"Washington
ficou surpreso com o sucesso da Turquia e do Brasil. Esperava-se que eles
fracassassem", escreve o autor.
O governo
americano acusou o Irã de assinar o acordo apenas para ganhar mais tempo e
evitar sanções. Já o Brasil e a Turquia foram acusados de serem ingênuos ao
acreditarem na boa vontade de Teerã. O acordo também foi rechaçado por outros
países, como França e Grã-Bretanha.
"A
desautorização imediata e dura da Declaração de Teerã enfureceu o Brasil e a Turquia.
O investimento pessoal feito por Erdogan e Lula em obter a Declaração de Teerã
fez com que a sua desautorização fosse nada mais do que uma rejeição da
liderança de ambos. E veio acompanhada de uma campanha agressiva na mídia
americana, acusando os dois chefes de Estado de vaidade, megalomania e
sentimentos antiamericanos e anti-israelense."
Parsi diz que o
desentendimento entre Brasília e Washington fez com que o governo brasileiro
vazasse para a imprensa a carta de Obama de 2009, na qual o presidente
americano pedia que Lula e Erdogan fizessem com que o Irã enviasse 1,2 tonelada
de urânio para enriquecimento no exterior. A carta, segundo Brasil e Turquia,
era uma prova de que os dois países haviam fechado um acordo com o Irã sob a
concordância da Casa Branca.
Os Estados
Unidos, no entanto, argumentaram que a capacidade de enriquecimento do Irã já
havia aumentado desde 2009, e que qualquer acordo com o Teerã precisaria exigir
mais do que apenas 1,2 tonelada de urânio.
Como
consequência, Brasil e Turquia votaram em junho de 2010 contra a resolução 1929
no Conselho de Segurança da ONU, que impunha novas sanções ao Irã. Segundo
Parsi, o resultado da votação foi um vexame para Washington. Nunca uma
resolução contra o Irã havia recebido tantos votos negativos, nem mesmo na
época de George W. Bush, um presidente que nunca se esforçara – como Obama – em
melhorar a diplomacia com o Irã.
Autor
O livro A Single
Roll of the Dice foi publicado pela Yale University Press no mês passado e
recebeu resenhas favoráveis na imprensa americana e britânica, em jornais e
revistas como Guardian, New Yorker e Economist. O autor do livro foi
entrevistado no influente programa americano de sátira política The Daily Show
with Jon Stewart.
Trita Parsi é
analista de relações internacionais e especializado em Oriente Médio e
contribui com artigos para sites e jornais como Huffington Post, Financial
Times e Wall Street Journal. Ele também é presidente do National Iranian
American Council, uma entidade que tenta promover a aproximação entre iranianos
e americanos. O grupo é bastante crítico em relação à política de direitos
humanos do Irã.
Para escrever A
Single Roll of the Dice, Parsi entrevistou autoridades de quase todos os
governos envolvidos na questão nuclear iraniana – como Irã, Estados Unidos,
França, Grã-Bretanha, Israel, Turquia e Brasil, inclusive o então ministro das
Relações Exteriores, Celso Amorim.
Fonte Imagem http://topnews.in/law/files/iran-nuclear-iaea.jpg
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