Primeiro, os meios de comunicação de massa da Coreia do Norte deixaram
os observadores internacionais intrigados com fotografias de Kim Jong-un em
companhia de uma mulher atraente. Depois, a televisão estatal confirmou as
suposições – aquela era Ri Sol-ju, esposa do líder norte-coreano.
A mudança no estilo político despertou agitação. Afinal, aparições
públicas das primeiras-damas, como na URSS e na República Popular da China, são
absolutamente incomuns na Coreia do Norte. O jovem Kim quebrou a tradição, como
fez o reformador soviético Mikhail Gorbatchov no passado.
Kim Jong-un e a esposa vistoriaram as obras de um parque de diversões em
Pyongyang, onde há um circuito de minigolfe, uma piscina e um aquário com
golfinhos. Os construtores militares cumprimentaram o casal aos gritos de
“hurra!” e ofereceram um buquê de flores ao líder norte-coreano, segundo
informações da agência de notícias estatal KCNA.
Para países de regimes fechados, como o da Coreia do Norte, isso é mais
um sinal de grande abertura e de abrandamento da imagem do líder inacessível.
No início de julho, um espetáculo com atores vestidos de Mickey Mouse,
ursinho Pooh, Branca de Neve e outros heróis famosos, foi exibido no canal de
televisão estatal. A apresentação foi feita pelo grupo Moranbong, formado por
ordem pessoal do líder norte-coreano alguns meses atrás.
No vídeo, os personagens dançavam enquanto, ao fundo, eram mostradas
cenas de alguns desenhos animados populares, como “Dumbo” e “A Bela e a Fera”.
Seria o mesmo que mostrar, na Broadway, a ópera revolucionária coreana “Mar de
sangue”.
Tão impressionante quanto tem sido a transmissão das Olimpíadas de
Londres até cinco horas por dia, em vez do antigo resumo de 15 minutos
apresentado no noticiário da noite. Os norte-coreanos receberam até permissão
para assistir à entrega das medalhas a esportistas sul-coreanos, fato inédito
na história da Coreia do Norte.
Reformas de base
“Por enquanto, estamos vendo mudanças no estilo da administração, mas
ainda é difícil afirmar se mudaram também os objetivos políticos do governo”,
afirma o diretor dos programas coreanos do Instituto de Economia da Academia de
Ciências da Rússia, Gueórgui Toloraia.
O especialista diz, no entanto, que há precondições para a mudança de
objetivos políticos. “Em especial, vazaram informações de que a Coreia do Norte
está experimentando novas formas na economia rural.”
Segundo ele, fala-se especificamente que, em 28 de junho, foi
encaminhada a instrução de formar brigadas de quatro a seis pessoas no campo em
substituição aos grupos mais numerosos. “Ou seja, trata-se, na verdade, de uma
família à qual caberá um lote de terra para cultivo e que poderá ficar com 30%
da colheita”, explica.
Gueórgui Toloraia afirma ainda que, se essa instrução for posta em
prática estará comprovado então que, no interior da elite norte-coreana, a
noção de reformas começa a amadurecer.
É preciso lembrar que as reformas na China e no Vietnã tiveram início
com medidas semelhantes na área rural. Elas permitiram a solução rápida do
problema da fome, e o Vietnã, três anos depois, passou de importador a
exportador de arroz. Quebras crônicas nas safras é o calcanhar-de-aquiles do
regime norte-coreano.
Política estrangeira
É notável que todas essas medidas tenham acontecido no pano de fundo do
afastamento do chefe do Exército, Ri Young-ho, explicado de modo bastante
nebuloso nos meios de comunicação oficiais, o que testemunha claramente a
redução da influência dos conservadores das fileiras militares.
“Tudo isso indica que estão acontecendo processos muito interessantes na
Coreia do Norte, e o vetor desse processo é determinada reviravolta no regime,
a passagem de formas de administração duras e persistentes a outras mais
maleáveis, em busca de novos pontos de referência”, ressalta Gueórgui Toloraia.
Entretanto, tudo isso está relacionado apenas à situação interna do
país. Ainda não está claro como vai evoluir a questão do programa nuclear da
Coreia do Norte.
Foram realizadas há pouco, em Singapura, negociações não anunciadas
entre diplomatas da Coreia do Norte e uma delegação norte-americana
extraoficial. No final do encontro, a vice-ministra norte-coreana das Relações
Exteriores, Choi Sung Hee, enviou uma mensagem eletrônica ao serviço coreano da
“Voz da América”.
O resultado do encontro, segundo ela, foi o entendimento de que “não há
outra saída, a não ser a retomada da questão nuclear em função da hostilidade
da política norte-americana”. Se não houver mudança na posição dos EUA,
declarou a diplomata na mensagem, a perspectiva de desnuclearização da Coreia
do Norte ficará muito remota.
“Se os EUA começarem a dialogar realmente e mudarem a sua política de
hostilidade, não em palavras, mas na prática, com o objetivo de solucionar a
questão nuclear e melhorar as relações entre os dois países, então estaremos
prontos a trabalhar nesse sentido”, afirmou Choi Sung Hee em uma comunicado.
Mais uma vez, o apelo direto aos órgãos de comunicação de massa norte-americanos
é mais uma ação de relações públicas para os norte-coreanos. E, nas
entrelinhas, nem tanto as ameaças habituais quanto o apelo ao diálogo.
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