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quinta-feira, 23 de abril de 2009

Um Olhar Sobre a Invasão Alemã na URSS

INTRODUÇÃO

Sem dúvida um dos momentos mais dramáticos da II Grande Guerra foi a invasão da URSS. Repetida à exaustão a frase de Hitler: “Quando Barbarossa começar o mundo vai suster a respiração”. Evocando a memória do imperador Frederico “Barba Ruiva” e o espírito de cruzada, aquele seria de fato uma luta titânica entre dois ditadores, seus sistemas sócio-políticos, seus povos...
Objetivando manter a URSS longe de seu próximo movimento – a invasão da Polônia – Hitler assinou um pacto com Stálin em agosto de 1939, que mesmo neutralizando uma possível ameaça soviética nas fronteiras orientais do Reich, garantia, isso sim tempo para que planos mais ambiciosos amadurecessem. Incidentalmente, ambos ganhavam tempo.
Surpreendente em si tal pacto, também não foi sem surpresa quando menos de dois anos depois este se esfumaria em pó, seria rasgado e sobre seus pedaços, passariam milhões de homens, milhares de tanques, aviões, morteiros, canhões rebocados ou autopropulsados, caminhões, blindados meia-lagarta e uma infinidade de armas e suprimentos de apoio aos combatentes na linha de frente.
Entre setembro de 1939 e junho de 1941, os exércitos do III Reich se haviam espalhado da Noruega ao Norte da África, de Calais até uma linha que descendo da Finlândia cruzava a Polônia e os Bálcãs ocupados e se apoiava nos aliados italianos, romenos, húngaros e búlgaros. As vitórias sucessivas eram, por si uma coleção impressionante obtida a um custo relativamente baixo – e sem dúvida desproporcional.
Por seu turno, a URSS vinha de um período onde as dificuldades em enfrentar os finlandeses e sua entrada na Polônia quando esta já estava praticamente batida pelos alemães, somado aos enormes expurgos na cúpula militar soviética, faziam duvidar do poderio de Stálin - se o“Guia Genial dos Povos” tinha algo capaz de se contrapor aos nazistas.
Se para Hitler esvaneciam-se as bravatas de Göering em submeter a Grã-Bretanha por ofensivas aéreas, e as dificuldades em implementar-se a Operação Leão-marinho com uma invasão anfíbia, a oportunidade de uma guerra no leste era tentadora.
Rundstedt, expoente de um outro Exército, e de outra época, não era o único a temer uma guerra em duas frentes semelhante a 1ª Grande Guerra de 1914-1918. A cúpula militar alemã tivera ressalvas quando a Wermacht vitoriosa na Polônia foi deslocada para o Ocidente, para enfrentar a Inglaterra e a França. Agora, novamente ela deslocava-se para o leste para fazer guerra aos soviéticos, rompendo um acordo que garantira a retaguarda do Reich. Se o temor não era novo, nova era a situação, pois ao contrário de 1939, eles estavam deixando um inimigo em suas costas ao mesmo tempo em que arrumavam outro bastante grande e indigesto à sua frente. Mas pouco podiam fazer exceto ponderar sobre os riscos, pois Hitler havia seguidamente tido sucesso em suas avaliações, frustrando relevantes opiniões contrárias, e que agora não dispunham de força para uma defesa mais firme sobre os benefícios da cautela.
Tais vozes esperavam que se o ataque contra a URSS era inevitável política, ideologicamente e militarmente, pelo menos que se aguardasse uma rendição britânica. Mas os adeptos da visão hitlerista destacavam que a Grã-bretanha tinha um império para recuar e prosseguir na luta, que o tempo lhes era desfavorável por eventualmente atrair os EUA para o lado dos ingleses e que, por fim, a demora apenas aumentava as chances da União Soviética ampliar suas forças.
Foi neste ambiente, marcado pela traição, pelas ilusões, bravatas e incompletudes que se elaborou a Operação Barbarossa e a puseram em funcionamento.

UM HOLOCAUSTO PARA STÁLIN

Nas horas que antecederam o desencadeamento da Operação Barbarossa – a invasão da URSS – tudo permanecia normal nas áreas de fronteira germano-soviética. Stálin proibira voos de observação sobre a fronteira alemã temendo produzir algum incidente que autorizasse um ataque alemão – ele permaneceria refratário aos crescentes sinais de perigo que se acumulavam, dos relatos de espiões até observações diretas. Assim, da mesma forma que o fragor dos exércitos do Reich se alinhando não foram “ouvidos”, também não foram “vistas” as crescentes concentrações de armas, homens e suprimentos próximos a fronteira. Mesmo os transportes ferroviários cruzaram a fronteira nos horários previstos sem despertar a menor desconfiança. Em Moscou, Stálin permanecia surdo aos informes vindos da espionagem em Tóquio e tolhia eventuais medidas defensivas de suas guarnições fronteiriças.
Entre uma respiração e outra, tudo mudou ao longo de milhares de quilômetros.
As 03:00 do dia 22 de junho de 1941 – por sinal aniversário da invasão napoleônica de 1812 - uma tempestade de fogo lançada por milhares de peças de artilharia e aviões anunciou a má novidade. A ela seguiu-se uma sucessão de ataques aéreos aos aeroportos militares soviéticos destruindo ou incapacitando, ainda no solo, boa parte das aeronaves disponíveis.
Mensagens urgentes corriam no sentido oeste-leste, rumo a Moscou. Em horas, seriam os exércitos alemães e seus aliados que empreenderiam a mesma jornada.

Três grupos de exércitos1 haviam sido reunidos para puxar os eixos de invasão: ao norte rumo a Leningrado, ao centro na direção de Moscou e ao sul, com destino à Ucrânia. No conjunto eles reuniam uma vantagem da ordem de 1,6 soldados para cada defensor soviético. Em canhões eram 1,8, em aviões 4 para 1 e 1,5 em tanques, totalizando cerca de 3 milhões de soldados em 149 divisões, das quais 19 eram Panzer (4 das Waffen-SS) e 10 outras motorizadas que penetraram profundamente o território russo buscando cercar e destruir o Exército Vermelho antes dos rios Dnieper e Dvina. Segundo o planejado, no outono a ocupação nazista se estenderia da fronteira polonesa ao Volga e as principais forças militares soviéticas deveriam então estar destruídas.

Entre 15 e 20 dias após o inicio da ofensiva, Von Leeb (comandante do Grupo de Exércitos Norte) havia penetrado 450 km e entrara na região do Báltico; já Von Bock (comandante do Grupo de Exércitos Centro) havia cercado dois exércitos soviéticos, destruíra e tomara Minsk e seguia rumo ao Dnieper; ao sul, Von Rundstedt e seu Grupo de Exércitos rumava para Kiev. Em 3 de julho um relatório do OKW (Alto Comando da Wermacht) afirmava que as forças alemãs haviam destruído as principais forças de combate do Exército Vermelho e que “...não será exagero dizer que vencemos a campanha da Rússia em apenas quinze dias”.2
Do lado soviético providências tardias foram tomadas no sentido de amortecer o avanço alemão.
Segundo avaliações sobre o Exército Vermelho, este seria constituído de um máximo de 140 divisões, mas durante o verão de 1941 mais de trezentas novas divisões foram enviadas para a frente alemã. Ao mesmo tempo, centenas de fábricas foram desmontadas e levadas mais para o leste, o mais longe do ataque nazista para que pudessem juntar-se ao esforço de guerra. No sentido oposto, rumo ao oeste, tropas e suprimentos seguiam para engajar-se na luta.
Mas as longas distâncias percorridas, a enormidade da extensão da batalha, o esgotamento físico e material dos invasores nazistas, aliado ao contínuo esforço de recomposição das forças soviéticas, haviam, dois meses após o início da Operação Barbarossa, reduzido a média de avanço alemão de 30 para 7 quilômetros/dia. Contrariamente a opinião de seus generais, Hitler decidira reforçar o ataque no sul, priorizando a tentativa de obter os recursos econômicos ucranianos, em detrimento do ataque a Moscou. Ao norte os esforços para dominar a região do Báltico eliminariam a frota soviética naquela região e permitira, a posteriori, desbordar as defesas soviéticas em torno de Moscou e cercar a capital soviética.
Em Leningrado a população correu em defender sua cidade e suas vidas. E além das tarefas defensivas, formaram-se milícias populares intensificaram a produção de munições e as estocaram para uso próprio. O mesmo foi feito no sentido de racionar os suprimentos e prepararam-se para um sítio alemão.
O tempo escorria e as dificuldades alemãs aumentavam.
O cerco de Leningrado se arrastaria por meses, custaria 1 milhão de vidas russas e a cidade não seria tomada. No sul, a luta por Kiev durou mais de dois meses e em seguidas lutas a força Panzer seria reduzida a 50% do seu efetivo. Ainda assim, dois exércitos soviéticos foram cercados e as denominadas frentes Sul e Sudoeste do Exército Vermelho recuaram para a margem esquerda do Dnieper., tentando esquivar-se a mais uma manobra de envolvimento dos alemães. O desfecho da batalha de Kiev levaria mais de 500 mil soldados soviéticos para o cativeiro e a morte. Em Odessa um ataque germano-romeno foi repelido; mas renovado com uma superioridade de 5 atacantes para cada defensor, a cidade acabou caindo – após um mês de lutas.
A situação era crítica para os soviéticos com Leningrado cercada, a maior parte da Ucrânia ocupada e os invasores aproximando-se de Moscou. Para o ataque contra a cidade foi montada a chamada Operação Tufão – um último esforço alemão que mobilizou 77 divisões, 1700 tanques e blindados e 950 aviões, num total superior a 1 milhão de combatentes. A conquista da capital era vista como a oportunidade de concluir a campanha.
Mas a batalha do bolsão de Viazma imobilizou quase 30 divisões nazistas, ganhando tempo para a defesa de Moscou. Tempo aliás que já havia sido ganho inicialmente com o deslocamento de forças alemãs do Centro para o Sul devido a indefinições de prioridade, e com as primeiras nevascas e o subsequente degelo – este sim paralisante por tudo transformar em lamaçais até secarem as estradas. Sob a liderança do general Zukhov e com a chegada de reforços do leste reuniram-se 14 divisões, 16 brigadas de tanques, 40 regimentos de artilharia, além de outras forças, que se somaram ao esforço da população soviética em prover a defesa de sua capital.
Os esforços alemães foram sendo contidos ao norte e sul da capital moscovita pelas defesas cada vez mais robustas e descansadas – ao contrário dos germânicos.
Entre os dias 1º e 4 de dezembro, o último ataque alemão foi detido e rechaçado, encerrando a ofensiva contra Moscou. No espaço de 15 dias – até o dia 5 de dezembro – os alemães haviam perdido cerca de 155 mil homens por ferimento ou morte (1/3 do efetivo) na batalha por Moscou.
Na retaguarda, Rundstedt defendera, ainda no outono, uma parada ou a retirada geral para a linha original de partida de 5 meses antes, em vista dos atrasos gerais na campanha. Agora, o Krêmlin seria apenas avistado, haveria uma reviravolta na situação e o próprio Rundstedt renunciaria por divergências com Hitler.
A primeira fase da campanha no leste terminara.
Quanto aos alemães, pelo resto da guerra eles não tiveram mais recursos para montar uma ofensiva geral ao longo de toda a frente. Para os soviéticos, uma sucessão de contra-ofensivas não só expulsaria os invasores alemães, como redefiniria a geopolítica internacional por décadas.

A resistência ao invasor alemão começou quase imediatamente. Na esteira do rápido avanço nazista, muitos soldados haviam ficado para trás e juntaram-se aos cidadãos que começaram a opor-se aos nazistas. Enquanto a luta se tornava cada vez mais feroz na retaguarda, foi-se estruturando uma rede de apoio e comando para este movimento resistente – a ponto de haver um Estado-Maior do Movimento Guerrilheiro agregado ao Stavka (Estado Maior Soviético).
Entre junho e novembro de 1941 eles auxiliaram, embora com enormes dificuldades, o esforço defensivo do Exército Vermelho. Retendo tropas alemãs que poderiam estar na linha de frente, sabotando as linhas de abastecimento nazistas, produzindo para o esforço de guerra em áreas liberadas e eliminando inimigos com tocaias e emboscadas, este movimento guerrilheiro tinha, em 1943, uma área de mais de 200 mil km de território sob seu controle e nas costas do invasor.
A previsão inicial do planejamento alemão havia designado até mesmo uma força entre 80 e 90 mil homens para lidar com os eventuais guerrilheiros soviéticos, pois era previsível alguma resistência. Mas não estavam preparados para dar conta de um efetivo resistente que alcançou mais de 1 milhão de homens e mulheres que retiveram 25 divisões da Wermacht, unidades da SS e do SD, além de forças auxiliares.
Mesmo assim, o impacto da invasão foi tremendo.
Quando foram detidos, a vinte quilômetros de Moscou, 40% da população soviética estava sob controle nazista. Em termos materiais isso representava:

Tabela 1
Avaliação das perdas materiais da URSS com a invasão de 1941

RECURSO %
Carvão 63
Ferro 68
Aço 58
Alumínio 60
Açúcar 84
Gado 38
Suínos 60
Fonte:3

Além disso, mais de mil plantas industriais foram desmontadas e transportadas por trem para além do Volga, ocupando vários milhões de viagens de caminhão, juntamente com os trabalhadores e gestores - com suas famílias quando possível, tudo no intuito de evitar que caíssem nas mãos dos invasores nazistas.
Estatisticamente o efeito direto da invasão de 1941 foi o de cortar o PNB (Produto Nacional Bruto) soviético, que fora de 128 bilhões de rublos em 1940, para menos da metade. Milhões de homens foram retirados das atividades produtivas pela convocação de reservas (todas as classes que prestaram serviço militar entre 1905 até 1918) além dos que voluntariamente se apresentaram para o exército e as milícias populares.
A interrupção nos fornecimentos de carvão, ferro, aço, laminados, rolamentos, etc, tinham um impacto direto não só no declínio dos indicadores macroeconômicos, mas também no esforço de guerra, reduzindo a produção de aviões, veículos blindados, suprimentos e armas em geral.
O deslocamento de fábricas e os esforços de evacuação e reinício da produção fora do alcance alemão consumiu grande número de trabalhadores. O enorme esforço de organizar a produção, compensar as perdas e iniciar novos projetos exigiam, por sua vez uma enorme organização da economia como um todo – possível pela planificação econômica vigente e o modelo de economia de comando centralizado. Os lugares vagos na produção foram sendo ocupados por contingentes de estudantes e mulheres. Às 500 mil mulheres empenhadas em trabalhos fabris, juntaram-se outros 510 mil estudantes. Nos campos, a convocação dos homens aptos para serviço militar, a escassez de peças de reposição, máquinas e combustíveis, somadas às exigências de manter a produção, fizeram recair sobre as mulheres e crianças o esforço – na maioria essencialmente físico – de manter a produção, embora isso não tenha sido possível.
As prioridades militares impuseram aos da retaguarda um duro racionamento que reduziu entre 35% e 40% o padrão de consumo médio. Ao lado da escassez, a elevação dos preços daquilo que se conseguia obter era frequente. Nas áreas rurais o consumo de batatas expandiu-se, enquanto o consumo de pão foi restrito a 300g por dia. As dificuldades faziam surgir coisas exóticas: na falta de cigarros, vendiam-se tragadas aos transeuntes!
Quando a retirada alemã começou a destruição foi ainda mais profunda.
Calcula-se que ¼ da propriedade soviética tenha sido destruída então, o que equivalia a algo como 17 mil cidades, 70 mil vilas, 31 mil fábricas, 84 mil escolas, 64 mil km de ferrovias e 45 milhões de animais. Milhões viviam em cabanas, buracos ou porões por terem perdido suas residências. Em 1942, 120 milhões de soviéticos consumiam menos que 48 milhões de britânicos – um inglês recebia uma ração semanal de 600 g de carne, enquanto um escriturário russo tinha que se virar com 250 g.
Mais o mais surpreendente, foi que, apesar de tudo isso, a URSS não só sobrevivera como ia inverter o curso do conflito.

RUMO A BERLIM

O fim da ofensiva contra Moscou colocou na pauta de decisões a divergência entre manter as posições ou empreender uma retirada para linhas mais defensáveis?
A questão foi recolocada após Stalingrado.
Rundstedt, Kleist, Manstein, entre outros generais, defendiam que à vista do crescente poder do Exército Vermelho, ainda assim seria possível negar aos soviéticos uma vitória, desde que se pudesse empreender uma defesa móvel. Aproveitando a maior experiência e organização, esperavam ser capazes de neutralizar as ofensivas soviéticas que certamente se multiplicariam aproveitando o crescimento dos recursos à disposição.
No início de 1942 foi ficando patente que mais do que renovar a ofensiva e prosseguir o ataque, mais prudente para os alemães seria poupar-se e organizar defesas em profundidade – embora Hitler insistisse em operações ofensivas.
Um dos primeiros sintomas da mudança das condições foi perceber que a Whermacht não tinha condições de um ataque estratégico ao longo de toda a frente oriental. Tendo que escolher, foi se contornando a batalha de Stalingrado, um saliente na frente de combates na região do Cáucaso. Terminando num enorme desastre que incluiu a perda de todo um exército, centenas de milhares de soldados, armas e equipamentos – além de um inédito Marechal de Campo (Von Paulus), foi um revés inédito...até então. Naquele verão, em quatro meses terríveis, a sorte da guerra fora lançada.
Em 1943, Kharkov representou a última vitória alemã no leste, logo ofuscada por um outro desastre: Kursk.
Segundo Manstein, as forças alemãs eram pequenas para apoiar-se exclusivamente num esquema defensivo. Ele então popôs duas alternativas para Hitler: atacando primeiro antes que os soviéticos pudessem recuperar suas forças, ou aguardar o ataque russo e ceder terreno em troca de um contragolpe. Ao aceitar a primeira alternativa e subsequentemente atrasar-se a ofensiva contra o saliente de Kursk, criou-se a oportunidade de uma antecipação por parte do comando russo.
Os atrasos alemães, o reforço das posições soviéticas no bolsão de Kursk, o pouco entusiasmo de Hitler numa operação cuja única alternativa era uma retirada estratégica no leste, contribuíram para o resultado final: mais um revés nazista na frente oriental e a impossibilidade de uma vitória destes naquela frente.

No total foram precisos 1418 dias de combate para o Exército Vermelho esmagar a Alemanha. As enormes perdas sofridas entre 1941 e 1942 haviam sido repostas, o movimento guerrilheiro fustigava os alemães na retaguarda e retinha consideráveis forças de combate e do extremo norte ao Mar Negro a frente se estabilizou. Para o povo e o país os esforços foram terríveis, mas eles haviam sobrevivido.
Em 1942 a URSS havia dobrado sua produção bélica em relação a 1940 e os efetivos militares eram um pouco superiores ao invasor pela primeira vez. A destruição do VI Exército de Paulus foi o prelúdio do efeito produzido pela alteração da correlação de forças nazi-soviéticas e que esteve associada as primeiras contra-ofensivas: contra os grupos de exércitos A e B a partir de Rostov (visando recuperar recursos econômicos) e empurrar os alemães no eixo de Moscou, além de romper o cerco à Leningrado. No início de 1943 o norte do Cáucaso fora libertado e na área de Voronezh, uma ofensiva contra o grupo de exércitos B derrotou não só os alemães como seus aliados, menos motivados e equipados, húngaros e italianos. Mas a extensão das linhas de abastecimento, por demais esticadas, acabou por deter a ofensiva soviética.
A frente se estabilizou em novas posições, como por exemplo na região de Leningrado, onde o cerco nazista foi parcialmente levantado. A produção soviética de aviões e tanques subiu para 3 mil e 2 mil unidades (respectivamente) e o efetivo militar chegou perto de 6,5 milhões de soldados, contra 5.325.000 alemães e aliados. Em artilharia e blindados os soviéticos já tinham cerca do dobro dos recursos nazistas; em aviões já tinham bem mais do dobro. E não eram só os números que ficavam desfavoráveis aos invasores, pois o equipamento tinha melhorado em qualidade e o moral do Exército Vermelho tinha sido recuperado.
Enquanto os soviéticos incluíam 2000 novos tanques (T-34 ou KV-1) por mês – em 1942 – os alemães somavam apenas 100 na versão Mark IV, inferior ao T-34 em tudo exceto armamento. Os novos panzers, modelos Tigre e Pantera eram prejudicados com constantes interferências de Hitler que introduzia modificações que atrasavam a produção geral. Já os soviéticos faziam grandes séries de seus modelos, acelerando a produção de suas unidades. A organização bem mais simples dos soviéticos era uma vantagem; já para a logística alemã, era um quebra-cabeças reunir as peças de reposição e combustíveis para uma força blindada que podia incluir os Mark III e IV, Tigres, Panteras, Ferdinandos (um destruidor de tanques) e canhões autopropulsados.


O quadro repetía-se na artilharia, equivalente à alemã, e o “Stormovik” era um notável avião de ataque ao solo, muito superior aos Stukas alemães.
Após o fracasso no saliente de Kursk uma ofensiva soviética na região de Orel expulsou os alemães, seguindo-se em agosto retiradas em Belgorod e Kharkov. Numa frente de dois mil quilômetros desenvolveu-se então a batalha pelo Dnieper. As ofensivas russas sucediam-se e entre o final de 1943 e início do ano seguinte, na Ucrânia, os alemães tinham metade das forças inimigas.

Nem a transferência de forças da região ocidental pode inverter a balança de recursos favorável aos russos. Do norte à região do Mar Negro prosseguiram as ofensivas soviéticas, que em março os levou a entrar na Romênia, recuperar a Criméia (desbaratando um exército alemão de 200 mil homens). Entre o inverno e a primavera haviam sido libertados quase 20 milhões de soviéticos e restabelecidas as fronteiras originais da URSS em uma extensão de mais de 400 km.
Enquanto a economia alemã era cada vez mais tensionada para suprir as necessidades de todas as frentes militares e interna, a produção bélica soviética ascendia a 29 mil tanques e blindados, mais de 40 mil aviões e 122 mil peças de artilharia, que no seu conjunto ampliaram as condições táticas e estratégicas operacionais do Exército Vermelho. Mesmo crescendo até 1944, a produção nazista foi privada, pela ofensiva russa, do acesso a recursos vitais para a indústria bélica alemã.
A incerteza quanto ao resultado final do conflito, a invasão aliada no Norte da África, e a Conspiração de Julho contra Hitler, por exemplo, começaram a agitar os aliados do Reich.
Na frente germano-soviética a Whermacht tinha 228 divisões e 23 brigadas totalizando mais de 4 milhões de homens, com 49 mil canhões, mais de 5 mil tanques e canhões de assalto, e uns 2.800 aviões. Já a ordem e batalha soviética reunia 6.425.000 soldados, 92.500 canhões e morteiros, 13.400 aviões e quase 8 mil aviões4. Enquanto o OKW (Alto Comando da Wermacht) avaliava que a renovação do esforço russo seria no sul, Stálin comunicava a Churchill que a ofensiva geral do Exército Vermelho ocorreria por etapas até atingir, entre junho/julho um engajamento geral.
No seu transcurso, a sequência de ofensivas russas consumiram entre junho e agosto, quase 1 milhão de baixas alemãs. Entre agosto e setembro os nazistas perderam mais meio milhão de soldados – mais de 200 mil aprisionados. A Romênia foi toda libertada naquele mês, juntamente com a Bulgária. A Iugoslávia foi liberada pela ação conjunta dos guerrilheiros e tropas soviéticas. No final de outubro Budapeste (Hungria) foi tomada e mais 188 mil soldados alemães foram cercados.
Neste ano, segundo Altgovzen, “O Exército Vermelho revelou uma enorme capacidade de sitiar e destruir grandes concentrações militares inimigas, em circunstâncias as mais diversas – em terreno aberto, em grandes metrópoles e também à beira-mar.”
A coordenação entre forças navais, aéreas e terrestres deram mobilidade e fluidez aos ataques soviéticos e garantiram a demolição dos aliados da Alemanha nazista: húngaros, romenos e búlgaros romperam com os alemães enquanto a Tchecoslováquia era ocupada e tropas russas aproximavam-se da Áustria, Polônia e sul da Alemanha. Ao norte, a frente do Báltico ruiu com a invasão sobre a Letônia, Estônia e Lituânia, além de penetrarem na Finlândia e Noruega

O último ato da tragédia aproximava-se do fim.
Para enfrentar os soviéticos, tropas foram deslocadas da frente anglo-americana para Berlim e a frente germano-soviética.
Na capital do Reich foram concentrados 1 milhão e duzentos mil homens, mais de 10 mil canhões, mil e quinhentos tanques e 3000 aviões. Já os soviéticos reuniram 2,5 milhões de homens apoiados por 42 mil peças de artilharia, 6 mil e duzentos tanques e mais de 8 mil aviões.
Numa batalha feroz iniciada em 16 de abril e que se estenderia até o dia 30 o perímetro defensivo alemão seria continuamente reduzido a frangalhos. Naquele dia, Hitler suicidou-se e em 1º de maio bandeiras soviéticas tremulavam nos principais pontos da capital alemã – oficialmente rendida no dia 2. Dali a 6 dias, o governo alemão capitularia incondicionalmente diante das potências aliadas.
Dos quase 14 milhões de soldados alemães mortos, feridos ou capturados durante a guerra, 10 milhões caíram na frente leste. O Exército Vermelho destruíra 500 divisões alemãs e mais 100 de seus aliados, contra 176 divisões derrotadas na frente ocidental; também foi no leste que a Alemanha perdeu a maior parte de suas aeronaves, navios e suprimentos.
A luta foi terrível, os sacrifícios inimagináveis, o sofrimento extenso e cruel. Mas a Alemanha estava ocupada e a URSS era uma potência continental vitoriosa – e a caminho de se tornar uma superpotência.


BIBLIOGRAFIA

JUKES, Geofrey – A Defesa de Moscou. História Ilustrada da Segunda Guerra Mundial, série Batalhas, Vol. 8. Ed. Rennes, Rio de Janeiro. 1975.

- KURSK, morte da “operação Cidadela”. História Ilustrada da Segunda Guerra Mundial, série Batalhas, vol. 17. Ed. Rennes, Rio de Janeiro. 1977.


História do Século XX, Vol. 5.

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