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segunda-feira, 27 de julho de 2009

Apontamentos sobre escravidão e terminologias






NITERÓI
2009
Assisti, em 2006, uma palestra da profª Sheila Siqueira, sob o tema Escravidão: novas
questões, em que ela apresentou uma série de informações relevantes. Entre elas destaco a tradução
da terminologia usada no século XVI e que, hoje, mesmo parecendo terem uma conotação
sinônima em certas palavras ou designações, não os tinham então.
Por exemplo: negro – crioulo – escravo; qual a diferença entre os termos? Ou não há tal
diferença?
Segundo ela, existiam sim diferenças.
NEGRO designava a condição de escravo, fossem os tais “negros da terra” (índios), “da
Guiné (africanos) ou “do islã” (mouros). Já o termo CRIOULO designava um escravo nascido no
Brasil. Se o mesmo fosse alforriado denominava-se FORRO, e não mais crioulo.
Já a expressão PARDO nada tinha a ver com miscigenação. Tal rótulo identificava um
LIBERTO de 3ª ou 4ª geração.
Mesmo o termo MULATO identificava diferenças não só de tempo como de espaço. No RJ
tinha sentido usualmente conferido de uma miscigenação entre negro e branco. Mas em São Paulo,
até o século XVII, referia-se a alguém com ascendência de branco com índio – depois chamado de
MAMELUCO.
A documentação também aponta para uma inexistência de identidade africana. As
expressões usadas eram: vindo da África, de origem africana, etc.
E o que dizer de inocente, pagão ou infiel?
O 1º era o indivíduo que mesmo sendo filho de cristão, por não ser batizado, era condenado
ao limbo em caso de morte. Diferentemente, pagão era quem desconhecia os ensinamentos cristãos,
enquanto infiel era aquele que rejeitava, apesar de conhecer, tais ensinamentos.
Abordando mais precisamente o tema da escravidão, ela começou ressaltando os estudos de
Lovejoy e Thorton, em termos não só do levantamento de fontes, como sua interpretação.
No geral, a escravidão (enquanto coerção física ou caráter de propriedade de alguém) define
um outro, o diferente ou um estrangeiro. Ele vem de longe, de fora...
Em termos legais as Ordenações, quer afonsinas, manuelinas ou filipinas não serviram para
instaurar a escravidão. Trataram, isso sim, de legislar sobre direitos consuetudinários.
Também refutou uma das ideias centrais de Fernando Novais acerca da escravidão e do
tráfico: a de que o 1º gerou o tráfico, já que outras interpretações invertem esta relação de
causalidade.
Justificada a partir da fé, da guerra (o mais comum) ou do mercado, ela ponderou, numa
interpretação livre minha: tanto na África como na América, os nativos combatiam entre si, porém
os ameríndios faziam prisioneiros, e não os escravizavam. Por que?
Como os índios não acumulavam, bloqueava-se a necessidade de obtenção de excedentes, o
que desestimulava a guerra escravizadora . Ou seja, a ausência de mercado – a rigor quase qualquer
um – impediu a um só tempo tanto a escravidão quanto o tráfico. Mas na África o contexto era
diverso, já que a existência de um mercado de escravos organizou poderosos Estados escravistas e
traficantes. A existência de uma disponibilidade de cativos, introduziu a escravidão. Esta, já
preexistente ao próprio Sistema Colonial, foi ampliada e capturada em variados graus, pelas redes
de comércio subordinadas aos interesses europeus.
Cerca de 12 milhões de africanos foram drenados para fora do continente, fora os que
pereceram em virtude da captura, transporte e alojamento. Se os europeus estavam bloqueados no
litoral do continente, em virtude inclusive das doenças, é evidente que existiu apoio local na
instalação de “castelos de escravos”, no redirecionamento das redes do tráfico interiorano para
estes, e na formação de uma vasta convergência de interesses: chefes locais, soldados e guerreiros,
canoeiros, produtores de gêneros, traficantes locais, agentes europeus, armadores, comandantes,
marujos...
Ela concluiu a aula com a exibição de um documentário por ela gravado – primeiro em
vídeo-cassete – e então em DVD, oriundo do canal GNT e denominado The African Trade.

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