Inevitável não relacionar o
pensamento de Bauman com uma das mais célebres referências marxistas, qual seja,
a de “que tudo que é sólido desmancha no ar”.
Dono de instigador olhar acerca da vida, das relações e dos fenômenos de
nosso tempo, ele é senhor de uma abordagem que recorta nossa existência, ou a
percepção da mesma, a partir de uma concepção que prima pelo transitório, que
faz da inconstância nosso “devir” contemporâneo.
Nosso mundo é o “líquido” que corre,
margeia, molda e se molda numa infindável transformação de tudo que somos, das
relações que fazemos e que pensávamos duradouras, das nossas expectativas enfim,
e que se choca com o paradigma da própria modernidade, este idealizado como
algo “sólido” e construído pela razão, pela ciência, pela modernidade
prometéica das conquistas e certezas.
Não mais a vida e destino escritos do berço ao túmulo, mas como evocam
os Titãs “A Melhor Banda de Todos os Tempos da Última Semana”. Tudo se desfaz, tudo se refaz.
Ledo engano, é no campo da pós-modernidade que a fluidez de
Bauman nos conduz não ao temor das incertezas, mas à percepção de que estas são
a própria essência de uma modernidade sem respostas definitivas, sem trilhas
prontas, seguindo sim os ventos caprichosos, sinuosos do imponderável vemos relações
afetivas, profissionais, hierárquicas que construídas sobre a perspectiva da
perenidade, perecem, se esfarelam, desintegram-se sob o impacto do momentâneo,
da brevidade. Vida incerta que instiga,
que assusta, traduzindo aquilo Guimarães Rosa nos empresta com sua poesia “O importante e bonito do mundo é isso: que
as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, mas que elas
vão sempre mudando. Afinam e desafinam.”
Opondo-se às estruturas que
vertebram e enrijecem ideias, corpos e expectativas, aquilo que ele aponta como
a Modernidade Sólida, tem na emancipação do indivíduo seu caráter inconstante,
que “liquefazem” as expectativas e os olhares: o tempo que encurta, a permanente
inquietude que impulsiona para o próximo e que desconecta o agora. O próximo livro, o próximo relacionamento, o
próximo trabalho, o próximo post, a próxima foto, a próxima rede, e a próxima,
próxima, próxima.....O agora é estado em perpétua transição pois a satisfação
daquilo que se conseguiu ou viveu, logo acaba atropelado pelo que virá.
Com o destino pleno de
oportunidades, o homem liberto de amarras contempla um mundo em que são suas as
responsabilidades, sendo a fortuna ou infortúnio resultados de suas ações. Individuo atomizado que livre das ideologias,
das instituições, de um tipo de vida não mais possível num mundo “líquido” que
é ressignificado pelo efêmero. Cujos
“sólidos” desfazem-se em novas perspectivas – novos “sólidos” - que por sua vez
também irão se dissolver.
Nova economia, nova moral, nova família,
novas ideologias expressam as incertezas da sociedade de massas, da
globalização , da espetacularização da vida privada.
Incerto, sem forma, inconstante,
assim é o mundo onde o individualismo “faz” amigos com a mesma velocidade com
que os descarta, deixando para trás a estabilidade destes relacionamentos,
substituindo a impermanência pela perenidade e assim por diante.
O
felizes para sempre as vezes não dura o final da cerimônia ou a fila de
cumprimentos.
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