Os brutamontes da extrema-direita
da Aurora Dourada se encarregaram de semear a ordem segundo seus costumes :
zero imigração africana ou magrebina, zero moradores de rua, zero pichações.
Não voa uma mosca sem que eles cortem suas asas. Seu reinado se estende desde a
Praça Ática até Agios Panteleimonas. A Aurora Dourada fez de Agios
Panteleimonas seu trampolim de conquista. Irrompeu no bairro em 2009 e em 2012
já obteve o melhor resultado eleitoral de sua história (15%).
Eduardo Febbro, direto de Atenas
Atenas - O crepúsculo está em calma. A
Aurora Dourada vela pela ordem nesta área central de Atenas onde não restou nem
um imigrante nem um indigente das redondezas. A extrema direita grega e seus
brutamontes de poucas palavras fizeram do bairro de Agios Panteleimonas (a
igreja ortodoxa) seu sítio privado. « É preciso colocar minas terrestres nas
fronteiras para que os imigrantes não entrem », diz um tipo enorme que não dá
seu nome porque não quer. Mas diz sem rodeios : « tem cara de esquerdista, como
teu governo », diz em tom de ameaça.
Houve uma época em que este perímetro de
Atenas era um bairro popular, com crianças que jogavam nas ruas e garantiam uma
barulhenta desordem. Já não é mais assim. Os brutamontes da extrema-direita da
Aurora Dourada se encarregaram de semear a ordem segundo seus costumes : zero
imigração africana ou magrebina, zero moradores de rua, zero pichações. Não voa
uma mosca sem que eles cortem suas asas.
Seu reinado se estende desde a Praça Ática
até Agios Panteleimonas. O número 52 da rua Aristomenus ainda carrega as marcas
da ação da Aurora Dourada. Em 2010, os valentões do partido de Nikos
Michaloliakos queimaram o local onde os imigrantes muçulmanos vinham rezar. A
polícia não abriu nenhuma investigação e nenhum vizinho protestou. Esta é a
terra da Aurora. Terra grega, como demonstra o ondulante silêncio das bandeiras
com as cores nacionais que tremulam nas sacadas.
A Aurora Dourada obteve nas eleições de
maio passado seu melhor resultado : 15% dos votos, o dobro. « Tenham medo, já
chegamos », disse Nikos Michaloliakos no dia seguinte. A metodologia dos
músculos deu seus frutos. A Aurora Dourada fez de Agios Panteleimonas seu
trampolim de conquista. Irrompeu no bairro em 2009 e em 2012 já conseguiu o
melhor resultado eleitoral de sua história. Os estrangeiros que ocupavam a zona
ou dormiam na esplanada da igreja foram expulsos a golpes. Imigrantes, judeus,
maçons, todos são inimigos da nação para este partido fundado por Michaloliakos
nos anos 80, logo depois de ter saído da prisão onde cumpriu uma pena (várias
na realidade) por atividades subversivas e violência. De modo similar a outros
movimentos europeus de ultra-direita, a Aurora Dourada cresceu sob o tema da
imigração.
Em frente da igreja Agios Panteleimonas há
um bar de onde os agentes da Alba vigiam a praça. É o seu reino. Os ultras
chegaram a ordenar até o fechamento da praça de esportes de Agios
Panteleimonas. Por quê ? « Vê-se que você não vive aqui, por isso pergunta essas
coisas : porque os negros e os romenos sujos vinham dormir aqui e sujar a praça
», disse Kostas, um morador local com claras simpatias pela Alba. A polícia do
bairro não interveio. Ela depositou a autoridade nas mãos dos neonazistas. A
Grécia tem uma população de 11 milhões de habitantes e há um milhão de
imigrantes. Um de cada quatro policiais votou pela Aurora Dourada nas últimas
eleições.
Tudo aconteceu muito rápido para os
gregos. Em apenas uma década : o euro, a falsa riqueza, os créditos fáceis, a
imigração, a crise e o abismo. Muitos analistas e militantes anti-racistas
pensam que o voto a favor dos neonazistas reflete o medo e a incompreensão,
muito mais do que uma ideologia.
Como em todas as partes, Áttica e Agios
Panteleimonas têm um anjo : Thanassis Kurkulas, responsável por uma ONG que
luta contra o racismo instalada no bairro há cinco anos, Deport Racism.
Kurkulas reconhece o perigo que representaria a Aurora Dourada repetir neste
domingo os votos de maio passado e ingressar no Parlamento (o que surgiu em 6
de maio nunca se reuniu pelo fracasso em constituir uma maioria de governo).
Mas também reconhece que « o imã dos neonazistas é forte : falam contra a
Comissão de Bruxelas e contra os imigrantes e isso atrai votos, mas não são
votos realmente ideológicos ». A situação é psicodélica : Atenas tem um bairro
inteiro onde a autoridade pública, a segurança, é assumida por um partido
político e não pelas forças da ordem. Polícia ideológica, sem controle algum. A
exibição de músculos dos « agentes » da Aurora Dourada mostra que bem que não
se trata de uma encenação ou aparência. Eles pegam, Maltratam. Insultam.
Agridem. Estado débil, milícia forte.
Os vizinhos de Attica ou de Agios
Panteleimonas que não aprovam esses métodos têm demasiado medo para intervir. «
Seja como for, é inútil. Há uma clara cumplicidade do Estado », diz Vassilis,
um morador da rua Aristomenus. O homem recorda que só uma das centenas de
agressões ocorridas nos últimos anos deu lugar a um processo. Silêncio. « A
delegacia do bairro não tem nem como pagar a luz. Se não estivéssemos nas ruas,
isso seria pior que o inferno », diz Kostas.
As histórias se cruzam nestas ruas com
extrema violência. A Grécia padeceu ao extremo sob as garras do nazismo mas
hoje vota em mais de 7% em um partido abertamente neonazista. A extrema-direita
se alimenta da crise. Em 2010, quando a Grécia já estava em um precipício,
Nikos Michaloliakos ganhou um posto de conselheiro municipal de Atenas. Um ano
mais trade foi filmado fazendo a saudação nazista, o que lhe valeu o apelido de
« Führer ». Ninguém sabe ao certo se as reivindicações de Hitler na televisão
ou os excessos cometidos pelos dirigentes da Aurora Dourada depois do resultado
de maio passado incrementaram ou, pelo contrário, baixaram seu caudal de votos.
Dimitir Psarras, um respeitado jornalista
grego especialista no tema da extrema-direita – ele vive, aliás, no bairro dos
extremistas – lembra que « parece não haver vacina contra o passado ». No
essencial, Psarras constata que, como em outros países do Velho Continente, o
esquecimento apagou o rosto dos neonazistas para instalá-los no presente com o
estatuto de atores políticos determinantes. Dimitri Psarras conhece bem o tema.
É autor de uma biografia de Georgios Karatzaferis, o líder de outro partido de
extrema direita, LAOS, e há alguns anos revelou como uma juíza da Corte Suprema
alimentava um blog violentamente antisemita com um pseudônimo. Segundo Psarras,
a extrema-direita faz pesar uma espada de Damocles sobre as sociedades : « com
eles sempre se corre o mesmo perigo ». Despertam e alimentam os piores
instintos. Além disso, obrigam os demais partidos a adotar os temas da
extrema-direita e, quando a crise chega ao máximo, oferece soluções fáceis para
pessoas que perderam completamente o rumo ».
O bairro de Agios Panteleimonas encontrou
o seu com o timão da Aurora Dourada. Ofereceu segurança a cidadãos temerosos e
a impôs prontamente. A noite cai suavemente, O vento é cálido, convida a um
passeio distraído. Mas cada vez há menos siluetas nas ruas. Em algumas zonas do
bairro, para caminhar à noite é preciso pedir permissão, peguntar com educação
e agradecer com respeito.
Tradução: Katarina Peixoto
FONTE: Carta maior http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=20358
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